O substituto
do aço estrutural pode estar nas florestas tropicais
Pesquisas com composto de fibras de bambu mostraram resultados
positivos. Solução ecossustentável poderia substituir o aço como reforço
estrutural de concreto
Com uma indústria cimenteira
consolidada e figurando entre os dez maiores produtores mundiais de aço, o
Brasil tornou-se autossuficiente nos principais insumos para a construção
civil. Mas nem todos os países são privilegiados e, para muitos, os custos de
importação tornaram-se um empecilho no desenvolvimento de grandes projetos de
infraestrutura e urbanização. O já citado aço é um exemplo. A demanda do
material, no entanto, poderá ser mitigada por iniciativas como a que vem sendo
testada em Cingapura. Lá, outro material tem o potencial de assumir o seu
lugar. Estamos falando do bambu, que é renovável, resistente e abundante em
diversas regiões tropicais e temperadas.
À frente de um dos projetos está o
programa Future Cities Laboratory (FCL), parceria dos centros de pesquisas ETH
de Singapura e Zurique (Suíça). Na avaliação de Dirk Hebel, pesquisador do
projeto e professor assistente de arquitetura e construção do Laboratório de
Composto Avançado de Fibras do FCL, a fibra compactada do bambu pode criar um
composto com resistência suficiente para substituir o aço estrutural em obras
de concreto. E mais: se os resultados das pesquisas foram positivos, países em
desenvolvimento poderão adotar a solução para o desenvolvimento urbano,
melhorando a economia local e a qualidade de vida. Programas de moradia e
infraestrutura podem usar a tecnologia, reduzindo, por exemplo, a dependência
de organizações de ajuda humanitária para construção de moradias.
Apesar de a solução ser recente, a ideia de
utilizar a planta na construção civil já vem sendo pensada desde o início do
século XX. Naquela época, pesquisadores tentaram utilizar o bambu como elemento
estrutural em construções, replicando uma iniciativa amplamente usada na Ásia
para fabricação de andaimes. Mas, a utilização precisa seguir parâmetros
corretos para ser viável, como explica o próprio Hebel, em entrevista à revista
Civil Engineering, da Sociedade Americana de Engenheiros Civis (ASCE),
publicada em julho desse ano. Nela, o pesquisador lembra que um dos erros é o
uso do bambu natural, não tratado. Ao entrar em contato com a mistura de
concreto, ele absorve umidade, incha e acaba encolhendo em ciclos, rachando o
concreto. Para piorar, a umidade pode trazer fungos que enfraquecem as
propriedades do bambu.
A solução? De acordo com a equipe do
Future Cities Laboratory, o material mais adequado seria os fios de bambu
comprimidos e processados com uma substância colante. O resultado das pesquisas
com o compósito foi promissor, resultando em um produto com maior durabilidade
e alta resistência à tensão. A metodologia de análise envolveu o uso de fios de
fibra das seções superior, inferior e média de um bambu chinês, com cinco anos
de cultivo. Elas foram unidas por uma resina a base de água, com baixa
volatilidade em compostos orgânicos, e carbonizadas para eliminar o açúcar e a
água presentes na planta. O passo seguinte foi compactar os fios em um molde,
formando diferentes desenhos e espessuras. O FCL destaca que prensas quentes e
frias estão sendo avaliadas nesse processo.
Em termos práticos, a composição testada resultou
em aproximadamente 80% de bambu e 20% de resina e apresentou uma densidade de
1,3 g/cm³, o que seria três vezes a de um bambu natural. “Estamos interessados
em controlar totalmente as propriedades do material, o que significa sermos
capazes de mudar os valores de expansão térmica e aumentar a resistência ao
fogo”, afirma Hebel. Ele destaca que o controle das propriedades é importante
para alcançar a certificação de órgãos normalizadores locais e tornar a solução
viável mercadologicamente. O desafio maior será cultural. O pesquisador avalia
que haverá dificuldade em convencer os construtores, acostumados à utilização
do aço para reforçar o concreto. “Iniciaremos a aplicação em nichos menores de
mercado, como em aplicações que exigem o uso de reforço estrutural não
corrosivo”, informou à revista da ASCE.
A estratégia de usar as fibras de
bambu em segmentos menores será complementada pela prospecção de adoção da
tecnologia em equipamentos esportivos e nas indústrias automotiva e
aeroespacial. A motivação seriam as propriedades de durabilidade, leveza e
flexibilidade proporcionadas pelo bambu, bem como a facilidade de cultivo.
Outro apelo é a sustentabilidade, uma vez que a planta é uma fonte renovável,
reciclável e um grande gerador de oxigênio. Por ser uma indústria limpa, a
produção da fibra pode incentivar pequenas e médias empresas.
O maior objetivo do projeto, no entanto, continua
sendo a indústria da construção civil, na avaliação de Hebel. Segundo ele, a
equipe de pesquisadores acredita que a técnica possa ser o propulsor de uma
nova era de industrialização em países pouco desenvolvidos, com produção e
investimentos mantidos localmente. O próximo desafio, de acordo com ele, é
levar os testes a campo e mostrar as possibilidades da proposta, o que deve
acontecer nos próximos dois anos.
Fonte: Grandes Construções
www.grandesconstruçoes.com.br
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